segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Imprensa - Dalai Lama em Lisboa

Dia 5:
«Terminou visita de Dalai Lama
Líder espiritual tibetano partiu para a Áustria

O líder espiritual tibetano, Dalai Lama, que hoje terminou uma visita de cinco dias a Portugal, partiu para a Áustria onde participará segunda-feira como convidado de honra num fórum internacional sobre «A procura do sentido da vida».
A visita de Dalai Lama à Áustria, onde visitará também um aldeia infantil SOS, já desencadeou um debate naquele país porque o Presidente da República, Heinz Fischer, não quer receber o Nobel da paz alegando «falta de tempo». No seu último dia em Lisboa, depois de cinco dias de visita, Dalai Lama falou para um plateia de dez mil pessoas numa conferência pública dedicada «Ao poder do bom coração» onde apelou à paz, ao diálogo entre as nações e à compaixão.»


16 de Setembro, Portugal Diário


«Dalai Lama, humano como nós

O Prémio Nobel da Paz esteve esta tarde no Pavilhão Atlântico. Nas bancadas da sala lisboeta, 10 mil pessoas ouviram-no falar de «paz», «compaixão» e «felicidade». O líder espiritual do Tibete fez questão ainda de explicar: «Sou como uma pessoa igual a vocês, mentalmente, emocionalmente, fisicamente. Sou simplesmente um ser humano».

O Pavilhão Atlântico costuma encher para receber estrelas da música do Pop e Rock mundial. Esta tarde, o Dalai Lama também conseguiu que 10 mil pessoas o fossem ver e ouvir à sala lisboeta. Muitos olham para ele como um profeta. Outros como um pacificador. Há quem vá mais além e o considere o «Buda Vivente». Mas o dono da gargalhada mais contagiosa do mundo das religiões disse que é apenas um de nós.
Uma hora antes do líder espiritual do Tibete entrar na maior sala de espectáculos da capital, o movimento em torno ao pavilhão era já intenso. Maria Brito, uma farmacêutica de 49 anos, explicava a razão de estar ali. «Não sou praticante, mas visitei recentemente a Tailândia e todo aquele misticismo e exotismo, a fé de pessoas e a comunhão com a natureza apelaram ao mais fundo do meu ser. Senti-me atraída por esta filosofia e prática de vida», disse ao PortugalDiário, considerando que a vinda do Dalai Lama é também uma «forma de recordar a questão do Tibete».
Cecília, de 28 anos, e Pedro, 25, também disseram ter «alguma afinidade com o Budismo». «O Dalai lama é quase um ídolo e tínhamos que vir hoje. A presença e energia dele é importante para a nossa caminhada», explicou ela. Com ambos a dizerem-se bem informados sobre os problemas que os tibetanos têm enfrentado, depois da invasão do território, em 1950, e do posterior exílio, em 1959, do seu líder espiritual, que actualmente reside em Dharamsala, na Índia.

«Sou simplesmente um ser humano»
Quem foi ao Atlântico à espera de escutar subtilezas místicas foi esclarecido logo ao início, pelo próprio Prémio Nobel da Paz, que não era disso que vinha falar. «Algumas pessoas vieram aqui com muitas expectativas. Isso é um erro. Eu não tenho nada para oferecer, só apenas alguns pensamentos. Há ainda algumas pessoas que acreditam que o Dalai Lama tem poderes mágicos. Isso é uma asneira. Alguns até acreditam que o Dalai Lama tem o poder de curar. Isso é um disparate», abriu assim a sua palestra o homem que se senta sempre que quer dizer coisas importantes.
O líder espiritual afirmou-se mesmo um céptico relativamente aos chamados milagres. «Devemos ser realistas, práticos», apelou, tratando de esclarecer que o qualificativo de Buda Vivente, que muitas vezes lhe é atribuído é errado. «Sou como uma pessoa igual a vocês, mentalmente, emocionalmente, fisicamente. Sou simplesmente um ser humano». E a gargalhada que se seguiu não o deixou mentir.

terapia da «compaixão»
O Ocidente, disse o Dalai Lama, descobriu os segredos do progresso material. Mas com o preço de um «vazio» que separa as pessoas da «felicidade» que não pode ser preenchido por nenhum tipo de solução técnica. O «stress, a solidão, a depressão» são os sintomas da «negligência» a que têm sido votados os «valores interiores», diagnosticou.
A perda de influência da religião e a desintegração dos núcleos familiares foram apontados como desagregadores de uma «educação» que levava as pessoas a estarem mais próximas da vida interior e como causadores do erosão que sofreu o «sentido da compaixão» - a palavra mais escutada da tarde.
Para o líder espiritual, a «compaixão», no seu sentido de «preocupação genuína pelos outros» é a resposta para uma vida que tem a felicidade como meta. «Mas isto é algo que exige treino» e uma educação para uma «ética secular», não no sentido de excluir as religiões, mas de incluir também os que não acreditam, defendeu.

«A paz não cai do céu»
A sua mensagem centrou-se também na questão da guerra e na resolução do problema do Tibete. Para o Dalai Lama, a paz exige um compromisso sério e a tomada de consciência da humanidade como um todo. «Não há o nosso planeta e o planeta dos outros», explicou, qualificando os conflitos como uma expressão de ódio que pode ser solucionado num duplo movimento de compromisso com «um desarmamento interior e de um desarmamento exterior». «A paz não cai do céu», concluiu.»


Hugo Beleza, 16 de Setembro, Portugal Diário

Dia 4:
«A luta da não violência


Sua Santidade o Dalai Lama não negoceia poder. De resto, ele recebeu-o de quem nunca viu, como reincarnação do anterior Dalai Lama, e sabe que nunca conhecerá o sucessor, que precisará que ele morra para poder nascer. Associar nestas circunstâncias poder espiritual e, de facto, poder temporal é completamente estranho. No entanto, ele sabe que existe um povo com séculos de identidade nacional à espera que se concretize o seu sonho de democracia e liberdade para o Tibete.

O Dalai Lama que esta semana fez uma visita de cinco dias a Portugal é uma personalidade tão estranha como fascinante. Em termos políticos, há quem o veja a par de Mahatma Gandhi, Martin Luther King e Nelson Mandela, mas ele interage com as pessoas de forma muito mais profunda. Ele age tanto na esfera política, como na social e na religiosa, em simultâneo com um poder inquestionável. Percebe-se o desespero de interlocutores como Mao Zedong, Chuen Lai e Deng Xiaoping quando em meados dos anos 50 o chamaram a Pequim para discutir o futuro do Tibete e pensaram arrebatar-lhe um compromisso. Impossível, porque ele é tudo, mesmo quando diz não querer nada.

Na base, Dalai Lama é símbolo de um poder teocrático como aqueles que, à semelhança dos ayatollah no Irão, se querem impor violentamente em muitos países muçulmanos. Mesmo com os princípios pacifistas, o seu restabelecimento no Tibete não deixaria, aliás, de colocar problemas. Seria, por exemplo, muito interessante verificar como numa sociedade aberta e tolerante vigorariam os rígidos princípios religiosos de castidade que, como afirmou numa entrevista à revista francesa ‘Le Point’, não permitem homossexualidade, nem sexo oral, nem sexo anal, nem sequer masturbação. Vingaria a repressão ou relativar-se-ia a castidade que marca o budismo, como de resto todas as outras religiões?

Prémio Nobel da Paz em 1989, o Dalai Lama é uma personalidade sem mácula. Assenta-lhe bem a deferência Sua Santidade. A sua presença é expressão de serenidade e tem efeito tranquilizador. Há, contudo, quem lhe aponte demasiado conservadorismo e algumas companhias com passado pouco recomendável. O professor alemão de ginástica que lhe ensinou como era o Ocidente e surge interpretado por Brad Pitt no filme ‘Sete Anos no Tibete’, de Jean-Jacques Annaud, era um nazi das SS, e na sua preferência pela Alemanha, entre os países europeus, multiplicam-se relações com personalidades de extrema-direita, nomeadamente o austríaco Jorg Haider, antigo governador da Carínthia e ex-ministro com passagem muito polémica pelo governo de Viena. No outro lado do Mundo, teve em tempos como grande dador de apoios financeiros o japonês Shoko Asahara, que perpetrou com a seita Aum um diabólico atentado com gás sarin no metro de Tóquio.

Nada de mal parece contudo pegar-se ao Dalai Lama que corre o Mundo a pregar a paz e a não violência como a única forma de luta capaz de derrubar uma tirania sem a substituir por outra. São nesse aspecto exemplares as propostas que repetidamente tem feito à China de Pequim para que haja democracia e liberdade no Tibete, de onde foi obrigado a fugir em 1959, sob a ameaça dos exércitos comunistas.O Dalai Lama, a quem os chineses tratam sempre por Tenzin Gyatso e fazem uma implacável perseguição diplomática, propõe-lhes um plano de paz assente no básico: Respeito pelos direitos humanos e a democracia; eleição de um governo democrático nas três províncias do país; administração estatal em cooperação com a China que continuaria responsável pelos assuntos de Negócios Estrangeiros e Defesa.»

João Vaz, 15 de Setembro, Correio da Manhã

1 comentário:

Anónimo disse...
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